quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Bienvenida la eternidad

Não te ocupes da vida que levo.


Não te perturbes do fim que espero.

Se da vida tens colhido prazeres,

Não te atenhas aos meus afazeres.



Que a vida é bela, nós o sofremos.

Se efêmera, poucos o sabemos.

Quando efígie, é Zeus sem equidade.

A vida: égide à eternidade!



Findo-a em um só golpe desvairado.

Reprovo-a em um só grito agastado.

Rompo-lhe frágil hímen infungível.



Não te atenhas aos meus afazeres:

Findo-a e Rompo-lhe, pois a Reprovo!

¡Es Bienvenida la eternidad!



David Luz

Rio, 13/10/2011.

Circunstâncias à morte

Quando vires o céu azul, morri.


Quando vierem as aves ao sul, parti.

Quando vires o mar acalmar-se,


Quando vier o peito a abrandar-se,

Quando vires o medo a sucumbir,

Quando vier o desespero a se despir,

Quando vires as tormentas se findarem,

Quando os aromas das rosas despertarem

Então, chegará minha alma ao HADES.

 
David Luz

Dedicatória

Dedico estes versos a vida alheia


E, posto que seja melhor que a minha,

Canto-lhe – pelas musas de Camões –

Obra pequena, medíocre e feia:

Homem sozinho, sem Deus, sem irmão.

 
David Luz

Iguais seríamos

Iguais seríamos se:


uma fosse a parideira

Cuja casa arquitetada

possuísse eira e beira

Sem padecer de colchão,

fogão ou geladeira;



Se às leituras de Homero

ninguém guardasse estranhamento

Que promove uma nobreza

e impede casamentos

Sem padecer de amor,

paixão ou sofrimento.



Igual seríamos se:

Jesus convertesse Maomé

E ensinasse o Corão

aos negros do candomblé

Depois de ouvir de um ateu:

Não desista tenha fé!



Se Comte contasse um conto

sem nada querer provar

Que provasse por experimento

que há coisas pra se explicar

Sem lançar mão das ciências,

buscado o positivar.



Igual seriamos:

Se “O negro também é dom!”

“Ser branco também é bom!”

Não cantássemos amotinados

No hino de toda nação;

Se o ser gente não houvesse tom.



Seriamos iguais,

Não fosse a falsa meritocracia,

A deturpação da democracia

A não compreensão do habitus

Que ao nos criar também nos guia

Obcecados a essa dicotomia.



Rio, 04/06/2011.

David Luz

Olhar de musa

Ao meu olhar, seja bem-vinda, Ó musa


desfarçada de ajudante! Raio fúlgido

deste nosso céu brilhante e azul, céu

de meus delírios ofegantes que

trazes a mim no instante, de repente.

Pois que, mesmo inocente, a culpo por

brilhar o teu sorriso no meu céu

Obsedando-me a razão com fel de

seu adeus silencioso a perscrutar.



Rio, 25/05/2011.

David Luz

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Communis error.

Embora, a um passo da vida, goze a morte;


É isto inextinguível eternidade.

Luzes baixas: sombras, ansiedade,

Mulher negra, tal qual aprouve à sorte,

Envolta em pano branco de equidade

Finge o prazer, sangra-lhe o corte.



Altas trevas, tudo é desejo.

Apenas eu não sou tudo.

Ao canto, desprezível e mudo,

Largo-me culpado do que vejo:

Algoz, insaciável e imundo

Provoca-lhe a ferida sem dar beijo.



O algoz tem muitas cabeças e membros,

Cada qual, no entanto, lhe concede pagamento.

Eis o veneno!Se pagas, tem aumento

o teu prazer, ó cavaleiro, posto que logo é novembro.

Sem pudor ou consciência várias vezes eu aguento

E – desde que decidi – não passo fome em dezembro.



Ao canto desprezível dos mudos,

Apenas prorrompo desconcertado:

Ó corpo negro, desalmado,

Resta-lhe de vida segundos.

A sacris, tens desdenhado,

Não mais sofrerás todo mundo.



David Luz

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Hora que tarda

Soa o sino em minha

Mente: badaladas, badaladas.

Sua o vinho em minha

Frente: gotas e gotas.

O som me introduz a nostalgia.

A dor me seduz a valentia.

Soa o sino: blén! Blén!

Sua em silêncio o vinho.

Recordo o tempo em seu bronze.

Saio do cronos por seu metal.

Saudai todos a hora final!

Por ora, aguardo-lhe chegar

Por hora é que sofro o vosso tardar.



David do N. Luz

Arcaísmo!

Aos olhos teus, os tenho fitos.

Encantos que mos impusestes vós.

Sepultá-los-ei no sarcófago de

minhas palavras cujos sentidos

hão desfigurado-se em arcaísmos.

De velhas que são já não hás tenho.

Está a memória perturbada.

Perturbada e velhamente gasta.

 
 
David do N. Luz